Mais uma noite como aquela e Draco simplesmente iria desistir de patrulhar os corredores, o que era sua função de monitor. Não via motivo nenhum para se manter acordado até mais tarde que todos e ficar andando de um lado para o outro naquele castelo gigantesco se...

- Nada nunca acontece. - resmungou o rapaz virando em mais um corredor depois de quase duas horas patrulhando. Não vira nem sequer uma mosca no seu trajeto que abrandia metade da escola.

Seu tédio estava atingindo o auge lá pela meia-noite, quando cansou de fazer o mesmo caminho repetidas vezes, e resolveu que ninguém descobriria se ele fosse dar uma volta no lago para esvaziar a cabeça antes de dormir. E se alguém descobrisse ele também não se importava, a diversão de ter autoridade sobre os alunos mais novos não superava a chatice das obrigações noturnas.

De tanto pensar nos prós e contras de deixar sua função de monitor, nem se dera conta do quanto andara e só parou quando chegou ao jardim e percebeu que lá fora tinha tanto para fazer quanto lá dentro. Andou a esmo por alguns minutos mas, ao ouvir o som das portas se abrindo, correu para se esconder no meio das árvores que tinham ali perto. Quando teve certeza de que estava totalmente oculto, arriscou um olhar para onde tinha vindo o barulho.

Sua testa se franziu por alguns instantes e não demorou muito para reconhecer a ruiva que saía do castelo. Se não estava enganado, já era a terceira noite em menos de duas semanas que aquela garota aparecia usando o mesmo casaco longo e fazendo as mesmas coisas. Ou quase. Dessa vez ela novamente olhou pro céu e pareceu falar e sorrir para o nada e, também como das últimas vezes, foi andando até uma macieira na beira do lago para se sentar. A diferença foi que, naquela noite, ela resolvera interromper o ritual e pegar uma maçã antes de começar a escrever no caderninho.

Draco não sabia ao certo o por quê de nunca ter-lhe dado um belo susto nessas noites que a vira mas também não se esforçava para descobrir; era simplesmente muito mais fácil ficar sentado na grama, escondido entre as árvores, pensando nos motivos que levavam aquela pequena ruivinha aos jardins tão tarde da noite e por tantas vezes. Como não achava resposta, se ocupava em olhar de longe e esperar a hora que ela voltasse para a escola para ele poder ir depois sem ser visto. Ainda sentado, olhou para os lados se dirigiu engatinhando ao tronco mais próximo para poder se apoiar mas, quando já estava quase chegando, sentiu a mão e os joelhos escorregarem e, com o susto, não teve tempo de amparar a queda, resultando num encontro do seu queixo com o chão. Com um salto levantou e começou a puxar a capa para pressionar a língua que mordeu sem querer e estava tão ocupado que nem percebeu o grito que deixara escapar e agora ecoava pelos jardins.

Já passava de meia-noite quando Virgínia resolveu chutar suas cobertas para o lado, sair do seu dormitório e ir passear pelos jardins da escola. O dia tinha sido vazio e cada mísero detalhe tedioso ficara marcado na sua mente à ferro. Todos os dias sempre a mesma coisa, todas as semanas nunca nada de novo acontecia, os meses eram tão iguais que ela se perguntava como já era agosto se nem se lembrava de ter passado por julho. Até essa insônia que a perturbava ultimamente sem motivo não mudava.

Como já estava acostumada a fazer o mesmo caminho tantas noites, seus pés a levaram diretamente pelos corredores mais seguros (para evitar esbarrar no terrível zelador). Para cobrir seu pijama, usava um casaco escuro e comprido, que balançava suavemente enquanto andava e se agarrava a um pequeno caderno e uma caneta.

Parou apenas quando finalmente se viu do lado de fora do castelo. O vento brincou com seus longos e ondulados cabelos ruivos, jogando-os para trás enquanto ela inspirava profundamente o ar fresco da noite e um sorriso satisfeito brincou em seus lábios finos.

- Olá. Sentiram minha falta ? - disse ela olhando para cima - Eu senti saudade de vocês. Aliás, estão especialmente lindas hoje.

Piscou com ternura para os pontinhos que brilhavam no céu negro e se dirigiu à sua árvore favorita, uma macieira alta e cheia de frutos que ficava perto do lago, olhando atentamente sua copa. Era sua noite de sorte.

Deixou o caderno e a caneta junto ao tronco e se posicionou estratégicamente embaixo de uma maçã muito vermelha. Precisou de três pulos esforçados até conseguir alcançar seu alvo, mas a dificuldade só a deixou mais orgulhosa de si mesma. Sentou, ajeitou o pequeno caderno sobre as pernas dobradas, deu uma mordida na maçã e começou a escrever absorta em pensamentos, sem nem ao menos perceber o par de olhos que a observava de longe.

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